Reforma trabalhista: consequências da decisão do STF

Avalanche de processos? Veja o que muda com decisão que invalida parte da reforma trabalhista. A Justiça do Trabalho sofrerá forte impacto com polêmica decisão do STF que derrubou parte da reforma trabalhista de 2017.
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O QUE ACONTECEU
• A reforma trabalhista de Michel Temer (Lei 13.467/2017) introduziu um artigo na CLT determinando que a parte derrotada numa ação trabalhista assuma custos de perícia, mesmo que seja beneficiária da justiça gratuita (trabalhadores de baixa renda).

• A mesma reforma acrescentou à CLT outro artigo determinando que o perdedor da ação trabalhista, ainda que beneficiário da justiça gratuita, pague à parte vencedora honorários advocatícios entre 5% e 15% do valor da liquidação da sentença, podendo esse montante ser retirado do ganho do trabalhador em outro processo que ele eventualmente tenha vencido.

O QUE O STF DECIDIU
• Essas normas da reforma trabalhista violam direito fundamental dos trabalhadores pobres à gratuidade para acesso à justiça trabalhista.

O STF acolheu a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) ajuizada pela Procuradoria-Geral da República.

EXCEÇÃO
• A reforma trabalhista prevê que, em sua ausência no processo, o reclamante (trabalhador) será condenado ao pagamento das custas, mesmo que beneficiário da justiça gratuita, exceto se houver motivo legalmente justificável.

• O STF decidiu que essa norma continua válida.

Alexandre de Moraes, autor da proposta alternativa

Por MARIALDA VALENTE (*)

A Justiça do Trabalho sofrerá forte impacto com polêmica decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que atinge diretamente o direito processual do trabalho. Por maioria de votos, em 20 de outubro de 2021, os ministros da Corte tornaram inválida a regra da reforma trabalhista (Lei 13.467/2017) que determinava ao beneficiário da justiça gratuita a obrigação de pagar honorários periciais e advocatícios, caso perdesse a ação e obtivesse créditos suficientes para o pagamento dessas custas em outra demanda trabalhista.
O STF acatou a argumentação da Procuradoria-Geral da República (PGR), na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.766, de que a norma viola a Constituição Federal que, em seu artigo 5º, inciso LXXIV, obriga o Estado a prestar assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. 
De acordo com a PGR, as normas da reforma trabalhista violam as garantias processuais e o direito fundamental dos trabalhadores pobres à gratuidade judiciária para acesso à justiça trabalhista.

Impacto em toda a Justiça Trabalhista

Não somente as partes da ação, reclamantes e reclamados, sentirão efeitos da decisão, como, também, a advocacia trabalhista no geral e, provavelmente, a própria instituição laborista, que poderá ter um acúmulo congestionante de ações. Como, na prática, a reforma trabalhista restringia o acesso à Justiça por parte dos trabalhadores pobres, ao instituir o pagamento de perícia e advogado pela parte perdedora, houve consequentemente uma redução do volume de demandas na Justiça do Trabalho. Quem não tinha recurso ficava com receio de, além de perder a ação, ter de arcar com custas elevadas. 

Com a decisão do STF, os que vivem em situação de pobreza extrema e que se encontram desempregados certamente voltarão a bater às portas da Justiça do Trabalho para postular possíveis direitos. Na dúvida, a prática sempre foi reconhecer o direito da parte menos favorecida.

O primeiro ponto em discussão foi o artigo 790-B da CLT (caput e parágrafo 4º) da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que responsabiliza a parte vencida (sucumbente) pelo pagamento de honorários periciais, ainda que seja beneficiária da justiça gratuita. Na redação anterior da norma, os beneficiários da justiça gratuita estavam isentos; com a redação introduzida pela reforma trabalhista, a União custearia a perícia apenas quando esses beneficiários não tivessem auferido créditos capazes de suportar a despesa “ainda que em outro processo”.

O outro dispositivo questionado é o artigo 791-A, parágrafo 4º, da CLT, que considerava devidos os honorários advocatícios de sucumbência sempre que o beneficiário de justiça gratuita tivesse obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa.

No alvo, a “litigância frívola”

No decorrer do julgamento, havia duas correntes. A primeira, do relator, ministro Luís Roberto Barroso, considerou as regras compatíveis com a Constituição e visavam apenas evitar a judicialização excessiva das relações de trabalho e a chamada “litigância frívola”. Essa corrente, integrada, também, pelos ministros Nunes Marques, Gilmar Mendes e Luiz Fux (presidente), defendeu a procedência parcial da ação para limitar a cobrança de honorários, mesmo quando pertinente a verbas remuneratórias, a 30% do valor excedente ao teto do Regime Geral de Previdência Social.
No outro campo, o ministro Edson Fachin votou pela declaração de inconstitucionalidade de todas as normas impugnadas. Segundo ele, as regras introduzidas pela reforma trabalhista restringem os direitos fundamentais de acesso à Justiça e o direito fundamental da assistência judiciária gratuita. Esse entendimento foi seguido pelo ministro Ricardo Lewandowski e pela ministra Rosa Weber.

Ausência à audiência inaugural pode ser punida

Contudo, prevaleceu a proposta apresentada pelo ministro Alexandre de Moraes, que julgou inconstitucionais os dispositivos relativos à cobrança dos honorários advocatícios e periciais da parte perdedora, mas admitiu a cobrança de custas se o trabalhador faltar à audiência inaugural sem apresentar justificativa legal no prazo de 15 dias.
De acordo com o ministro, a lei estipula condições inconstitucionais para a gratuidade da Justiça, ao partir da presunção absoluta de que um trabalhador, ao vencer determinado processo, já se tornou autossuficiente. A seu ver, as normas apresentam obstáculos à efetiva aplicação da regra constitucional que determina ao Estado que preste assistência judicial, integral e gratuita, às pessoas que comprovem insuficiência de recursos (artigo 5º, inciso LXXIV).
Em relação à cobrança de honorários de sucumbência dos que faltarem à audiência inaugural sem justificativa, o ministro Alexandre levou em conta que se trata apenas de mais um requisito para a gratuidade judicial.
Em voto pela inconstitucionalidade de todas as normas impugnadas, a vice-presidente do STF, ministra Rosa Weber, observou que, a pretexto de perseguir resultados econômicos e estímulos comportamentais de boa-fé processual, que poderiam ser alcançados de outras formas, “as medidas legais restringem a essência do direito fundamental dos cidadãos pobres de acesso gratuito à Justiça do Trabalho em defesa dos seus direitos”.

O que prevaleceu no final do julgamento

Por maioria de votos, o STF considerou inconstitucionais os dispositivos que estabelecem a necessidade de pagamento de honorários periciais e advocatícios pela parte derrotada que seja beneficiária da Justiça gratuita (artigo 790-B, caput e parágrafo 4º; e artigo 791-A, parágrafo 4º; ambos da CLT). Os parágrafos citados nos dois artigos autorizam o uso de créditos trabalhistas devidos ao beneficiário de justiça gratuita em outro processo para o pagamento desses honorários. Integraram essa corrente os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e as ministras Cármen Lúcia e Rosa Weber.
Também por maioria, foi considerada válida a regra (artigo 844, parágrafo 2º da CLT) que impõe o pagamento de custas pelo beneficiário da justiça gratuita que faltar à audiência inicial de julgamento e não apresentar justificativa legal no prazo de 15 dias. Esse entendimento foi seguido pelos ministros Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Roberto Barroso, Nunes Marques, Gilmar Mendes e Luiz Fux (presidente) e pela ministra Cármen Lúcia.
(Com informação do STF)


(*) MARIALDA VALENTE
Editora de Pro Today
Advogada
E-mail: contato@protoday.com.br
WhatsApp: (62) 99966-7666

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